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Pé ante pé



Dois a dois o incauto ser se busca no lapidar das pedras.
As vielas apertadas e a cidade escura. Faltam palavras aos vultos que guardam as janelas com um sôfrego descair de olhos.
Não se deve guardar a noite na alma. Os vícios escondidos da vida escurecida pela malandrice repudiados pela cortina pesada. O esvoaçar de sons ébrios, onde corpos mutilados pela ânsia de se fundirem lutam por se manterem absortos, povoa o ar enegrecido pela cinza do pensamento vadio.
A noite é um ser absoluto, incontestável e extremamente enervante. Causa-nos um beliscar de consciência e um despertar de morfologias perigosamente desejadas. Pé ante pé a noite se impõe aos transeuntes como se uma sina fosse, como se uma charada de esfinge actuasse sobre a passagem dos viventes.
Lindo.
Novo.
Velho.
Tudo se impondo como se rótulo fosse e os becos mais enlameados fossem a corte dos réis novos, os triunfadores do desejo bulício que impera nos recônditos da alma suja. Todos sabemos que é pé ante pé que a noite entra, se agrupa e cria nichos onde toma de assalto as redondezas da vida. Vai sugando o élan das almas nobres e as torna em quadros manchados, cadavéricos e dilacerantes da benevolência divina.
Por isso se fecham os corpos nas casas, as crianças são trancadas nos quartos e histórias belas lhes são dadas como ilusão. Por isso o sonho, a ilusão e o dormir acompanhado na solidão. Por isso as entidades de diversão, de libertação e escrutínio do prazer.
Somos uns fugidos da noite, uns salteadores de sentimentos como se de ladrões quiséssemos distância. Roubamos esperanças como que crentes na possibilidade de enganar o desdém, a fluidez do tempo animal e os encantamentos do segredo tentador
Mas que fazer?
Fechar a porta, cantar as preces dos antigos e acreditar nos encantamentos. Talvez a luta contra tudo nos mereça a morte sem dor.
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