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Setenta vezes Sete




A minha música favorita é uma melodia só. Uma melodia que ouço nas horas sós.
Podem passar os anos, as pessoas, os momentos
   (os carros na rua. as pessoas que andam. é tarde e não sei porquê, não vou para casa)
até podem passar sete anos
   (sete carros. sete pessoas que andam. são sete da tarde e não sei ainda porquê, mas não vou para casa)
que a melodia vai estar lá.

E passa o tempo, as crianças correram
   (sete crianças num parque)
e a minha mãe que diz: "é quase meio século".
   (quantos setes tem cem?)
Meio século quase e ela pergunta sempre o mesmo de sempre: é saber se como, se durmo, se estou bem. Depois lá disfarça a saudade, adoça a voz e diz um "tá bem" muito melodioso.
É essa a melodia que guardo quando estou só. Guardo os suspiros de quase meio século. Embalo os olhos, que se resignam, numa caixa dentro do coração. Deposito na conta da memória, essa que conta o carinho, as roupas passadas, as refeições silenciosamente apuradas ao lume.

A melodia que mais gosto é a do carinho. Por isso ela me faz companhia na solidão. Mesmo que passem setes eternos ela vai comigo, até o setenta vezes sete passar.
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