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Calmo




Dormiam as estrelas embaladas pela lua e o mar ia e vinha numa interminável certeza. Os rostos gastos do dia descansavam em almofadas próprias. Uns felizes, outros melancólicos e outros perdidos. Subia das tocas da terra um som agudo imitando um clarinete.
Eu, sentado num banco de madeira, via a noite espalhar-se pelos cantos, fazendo tudo descansar num sono profundo. A noite cheia de luz e paz, onde imperava um silêncio preenchido por grilos e o calor do meu peito. Balançava o meu corpo com o vento leve e levava aos lábios um copo de vidro corriqueiro. Sorvia o líquido em goladas espalhadas, deixando o líquido preencher todos os buracos que abria com o meu pensar. Sempre escavei muito de noite.
Na minha mente aclaravam-se letras e versos, construíam-se sonhos e desejos castos. No fundo do poço que sou eu brincavam mãos de crianças eternas, porque não conheciam o tempo nem o espaço.  Elas cantando canções milenares e rindo das minhas dores que atiro, como se peluches se tratassem, porque as crianças precisam de brincar.
Os meus olhos fixos num rosto sorridente e sereno, espelham minha alma calma que contempla a noite e recorda o dia, o dia célere e intenso, onde o sangue fez moça nas veias e o coração se apressou no toque das mãos.
A minha alma cheia de retratos frescos e saltitantes como insectos no verão.
A minha alma juntando um dia em pedaços de lã eternos.
A minha alma acalmando por saber algo dos outros.
Fico no banco de madeira mais um pouco.
A vida faz sentido quando recordo o vento dum dia. 
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