Share
ShareSidebar


Depois do tempo




Sabia na profundeza do ser. Sabia que as letras estavam presas no céu da boca e tu de frente clareando a hipótese.
Inviável - pensou.
Mas que sabia, sabia!
Passeavam entre uma vegetação de fim de Primavera e inícios de Verão e conversavam de assuntos habituais. Paravam por vezes, viam uma montra, enamoravam uma roupa e andavam. Era um ritual citadino como tantos outros. Uns iam aos gelados, outros viam as vistas e uns ficavam-se pelas explanadas. Era o anonimato da acção em conjunto aglomerado, a repetição mais comum num espaço urbano onde se juntam as pombas.
Isto era a cidade e eles passeavam as pernas e o pensamento entre calçadas e sonhos.
Um suspiro fez ele, um olhar o outro e a desconfiança nasceu. Algo se passava debaixo daquele sol habitual para a época. Nasceu a pergunta da praxe, respondeu uma cabeça pendente e a repetição dum suspiro. Vista a grandeza do problema o outro recuou e continuaram a contar a calçada. A vida dos dois era aquilo, um passeio distraído e cheio de becos desconhecidos. Tocavam-se por sinais e evitavam-se por presságios.
Era um jogo estranho mas resultava. A  vida é feita de combinações improváveis, coisa de ser feita por homens.
Subiram a rua, comentaram uma tipa que passava e os cartazes dum evento qualquer. Decidiram gostar do evento e talvez aparecerem à coisa.  Nada como uma actividade socialmente correcta.
Ele andou até ao carro com a companhia daquelas pernas conhecidas. Pegou na chave e carregou no botão. As portas abriram.
Entrou.
Disse umas últimas palavras e pintou o desejo nos olhos.
A mensagem chegou ao destino mas era tarde. O tempo tinha ficado lá trás na explanada numa tarde de Outono.
Comentários
0 Comentários

0 comentários: