Share
ShareSidebar


Um poema



Trovas medievais ... sempre viveste na escuridão. As pessoas não são românticas! Pergunta a uma mulher de quarenta anos, com um filho a morrer no IPO
   (sim. tou a morrer. anda para aqui!)
com uma doença injusta. Porca de vida!!! Tão jovem, antes fosse eu.
E enquanto esta gente vive os espinhos da vida, uma cambada de inteligentes sentada em mesas a fazer poemas. Reunida em volta de temas pessoais, cheios de suspiros e amores platónicos. Gostava de saber como escreviam uma leucemia galopante, salteadora de sonhos, planos e certezas permanentes.

"Mãe vou morrer."
Olhos fixos e pejados de lágrimas. Uma cena abominável, dilacerante, inumana. Meu filho, meu pobre filho! Ai , era injusto demais.
"Mãe vou morrer."
E eu sem acreditar, petrificada com tal disparate. Mentira, só podia! A gente de vinte anos tem sexo, sai para a noite, fuma umas drogas e apanha umas bebedeiras. Qual morte qual quê? Isso é para a tua avó, coitada, nunca mais vai e deixa a herança!
"Mãe vou morrer."
Não vais não. "Cala-te! Quem te disse isso? Vou processar os médicos e vais ficar bom!"
(ela sabia que era mentira)

Poemas cheios de segredinhos e joguinhos de palavras. São as flores, a cor das flores, a posição das flores. Depois a métrica, as vogais, as virgulas mais os pontos.
A vida desmontada em versos cheios de sentido fundo. Mas não são remédio. Remédio é a quimioterapia, as injecções, os vómitos.
Estou farta.
Haverá um poema sobre isto que sinto?
(silêncio)
Tem de haver ...
Comentários
1 Comentários

1 comentários:

João Bosco da Silva disse...

Porra! Muito forte mesmo!Acredito que haja muitos poemas sobre isso, alias, cada poema é uma luta contra a morte, uma tentativa de deixar na eternidade um reflexo do nós, um rumor da nossa existência... mas um dia não haverá quem os leia e nos sinta e que interessa que nos sintam se não é a nós, mas o que as nossas palavras de morto futuro lhe suscitam, levantam deles.