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Néon



Dourada praia dos distantes, onde repousam os restos dos santos. As ruas da praia distante, onde moram as lágrimas dos justos, são caminhos iluminados por pirilampos ancestrais.
São luzes de néon que chamam os transeuntes que passeiam.

A santidade também se vende.
Grandes reclamos de luz que se afiguram na rua onde gatos
(todos juntos num bando de silêncios)
se escondem porque não existem.
Diz A. Lobo Antunes que os gatos não existem, eu concordo.

Voltando aos caminhos trilhados por todos, a santidade vende-se nas veredas menos próprias. Uma menina lá na torre, um homem suado mais ao fundo, uns desinibidos que, sendo homens, também se acham gente.
Não sei se me percebem, mas os gatos fogem e não existem, e é pena quando os homens ousam eliminar-se da terra e refugiar-se nas esferas armilares do tempo dominado por um punhado de dedos fechados envolta de si.
De que vale escrever o código dos deuses?
O Olimpo é inatingível e a velhinha do segundo direito já tem os pés à espera de terra ou, talvez, cal. Não é ela mais que Mozart,
não é ela mais que eu.

Centremos-nos na praia de lá de longe. Não há mar, nem algas, nem umas famílias intimamente pobres, que se passeiam em fatos de banho rasgados e falam da última trivialidade televisiva.
(desejo Sintra nestas horas de hoje. fresco eterno. um monte de calamidades ordenadas em arte ... é bonito!)
A praia é um campo aberto onde,como já disse, repousam as almas estendidas dos justos, como se de uma cesta se tratasse a perfeição. Um amielhar de dias correctos e a pachorrice eterna do ócio numa praia nossa. Talvez umas discussões superiores, ou uns olhares esvaziados como se algodão claro fossem os olhos.
Prefiro muito mais retratar isto tudo como a hipocrisia dos felizes ditos, que se acotovelam com dúvidas uterinas e pintam na cara o gozo celestial dos mentirosos anteriores.
Não acredito em praias, acredito em florestas.
Acredito em plátanos de Outono onde muito se passa desde a raiz ao céu.
Acredito nos gatos que não existem. Na sua sombra rápida e no seu toque sempre lento e tardio.
Acredito em fantasmas, ou seja gatos.
Acredito pouco numa alma pura de mácula e ardor. Bonecos de cera só queimados e mesmo assim ...

Em suma a praia dos pirilampos de néon, onde bichos iluminam as faces cândidas da justiça são falácias,
bem,
eu digo que sejam.
Mas vou deixar a senhora velhinha acreditar no mealheiro das penas que guarda debaixo das peles já cansadas.
Só ela sabe porquê ... só ela.
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