Share
ShareSidebar


Duplicidade



Cada sonho de hoje é um adiamento anterior, um mistério contemplado pela multidão existente. Não existem génios quando as noites são de luzes de neon, é uma incompatibilidade. O mundo é demasiado disfarçado, esfumado, entregue à livre movimentação.
As pistas não são depósitos de sabedoria ou reflexão, são canibalismo encarnado no movimento que expele suores e imagens incongruentes e, por isso, infinitamente falsas. As pistas são falsas, são esse adiamento de tudo que remete, como já expliquei, ao sonho, à impossibilidade de realização que tanto cativa na contemplação do se permanente.

Imaginem eu rico, feliz e com muitos parentes.
Eu reduzido a um retrato de Hollywood barato, dessa fábrica de imagens repetidas dum principado. 
Um carro guardado com a minha nominação em papeis importantes.
A casa com decoração, móveis de correntes e tintas de acolhimento. 
Sofás
Jardim
Comodidade em dose contemporânea e um pequeno gozo com uma superioridade inventada perante o vizinho. 

São imensos os sonhos, mais que o universo porque creio que o ultrapassem. Talvez esse mundo para lá se sobreponha ao mistério.
Sonhar como mais que contemplar.
Sonhar mais que uma fé.
Por fim, sonhar mais que o globo, suprimir a uma espécie de baú os limites de infância e ultrapassar o crer. Unicamente ser um utensílio da criação, da capacidade de inventar para além do ócio.

Sou um mero fiel desta era. As coisas que penso foram já pensadas, mastigadas, esticadas ao limite. Nada disto é meu, ou até nosso, deste local. Tudo é global, amplo, demasiado espalhado para ser perceptível ao conhecimento humano. 
Já não observo, cumpro. 
Sou um crente das mordomias eléctricas, dos canos sem fim, do cimento armado em forma de representação cultural que abrange tudo.
Detesto o verde e proclamo as glórias de ser peça do mecanismo. 
Amanhã, num desesperante dia infame, terminarei em suspiro ou dor, talvez convencido que fui a imagem mais clara deste tempo, destas horas, destes noticiários ardilosos e corajosamente oferecidos como um remédio único do boticário. 
Em suma, sou um ditador contido.


Colocar o corpo ao serviço do sonho e assim atingir a arte. Ver os verbos tomarem forma num aglomerado de surpresas encantadoras, talvez elas o belo.
Isso mesmo, desejar o belo.

- Eis o seu café.
- Obrigado ...

(penso que morreu isto)


Comentários
0 Comentários

0 comentários: