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Novembro




Abre-se no peito o abismo e todos vão lá tirar pedaço. Levam aquele tempo, aquela imagem, aquele segredo de esperança infantil.
Trair.
Trair a esperança cândida do menino que pinta uma arte única que só ele entende.
Trair o sorriso que corre na boca do menino de sua mãe.
Trair a ideia de ser jovem poderoso e ter o mundo, mais que aos pés, explicado na cabeça.
É sempre trair a vontade pura de ser feliz. E depois já não é branco de lavadeira da ribeira, é cinza, preto ou escuro.
Tem chovido estes dias e as histórias têm ficado cá dentro, batem à porta do coração mas ele não se abre. Se calhar porque tudo lhe mente ou os olhos endurecem tudo com mais um dia de dor. Talvez queira só ficar em casa, ver a chuva cair enquanto um romance corre nos teus olhos,
   (olhos de quem? não sabes a essência das coisas. espetas um punhal no peito vem tudo, até o que não conheces. não sabias que eras homem?)
nos teus olhos coração.

É.
Cresce o pelo, a barba, o ombro e o corpo. Cresce a vida, a rede, as palavras, os cantos meus. Cresce a vontade de ter o que não tenho e assim fico só.
É tudo assim.
Pequeno dia, pequena hora, pequena noite no olhar. Sabes que estás ferido, menino de sorriso na boca. São palavras tuas que dizes, menino com boca
   (o sorriso ficou-se colado na cara desde um tempo imemorial. quem vos manda chorar?)
de rei num mundo teu. Pintas o sol de azul, o mar de amarelo e o outro não pintas, não há ninguém.
É, menino com boca
   (não vou falar mais do sorriso, já estava cá antes)
dizes e fazes, contas e refazes. Mas que recebes? Palavras ocas borradas de indiferença. Será nódoa preta, cinza, escura? Nunca branca de lavadeira da ribeira.
É, menino com boca que fala tanto.
Hoje não te vão ouvir. Muda esse hábito de falar que a vida não é assim.
E se não aprenderes desta, vais ver, os pelos crescem e fazem barba. O corpo muda e cresce o ombro. E, com o tempo, tudo isso muda, silencia, acaba.

Faca no peito,
sangue que verte,
magia de bruxa.
A vida não brilha hoje,
por isso custa.
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