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Chave



Quem sabe onde este caminho leva? Dois faróis ali à frente, a ponte sobre o rio e eu sobre a ponte e pessoas nas margens. Fogueiras a aquecer as pessoas e eu sobre a  ponte enquanto nuvens de chuva sobre o carro e fogueiras invencível nas margens. Gente derrotada abraçando o fogo com um ar pesado e olhos vazios de tão baços.
Esta noite de chuva é feita de gotas de vinho e limão. Bebem os pobres o limão, os ricos o vinho, os heróis o vinagre espetado em esponjas convenientes. E tudo isto na ponte. Dois lados, dois povos, a mesma gente. Todos dominados pelo dinheiro e amansados pela chuva.
Correm as gotas em charcos calcados pelos faróis dianteiros a mim. E eu com faróis anteriores. Mosquitos pegados ao vidro e a música aqui dentro. Estas palavras aqui dentro coladas aos estofos, saltando nas madeiras da frente e brincando nos bancos de trás. Na mala vão palavras bailarinas, não as quero perto de mim, muita alegria.
Desde sempre conheço  a ponte. Mal nasci um pobre ao meu lado a dizer: "na ponte há fome". Eu não acreditava, tinha os seios da minha mãe. Hoje acredito, minha mãe morreu à três dias. Fui colocala numa gaveta hoje. A ideia da chave que me deram junta, aqui, com as palavras. Eu um dia uma chave, e agora fome no estômago. Deixei de ter seios e é tão triste!
Agora sou pobre. Vou chegar a casa,
(a casa é depois da ponte. parece impossível, porque a ponte é grande)
 queimar os livros, ordenar as ideias e chamar uns pobres. Respirarei lentamente com os olhos baços e os pulmões cansados. As ideias murmurando palavras de dor e outros, como eu, vendo o fogo.

Deixei de ser fogo.
Sou nada.
Um dia uma chave serei.
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