Share
ShareSidebar


Diagramas



Toma este apontamento sobre negro, as folhas correndo
um pé e a mão,
ai que dança.
Pai vês-me? 
Vejo filha, as páginas correm e tu linda dançando, um pé para a frente, as mãozinhas. Tenho tanto na cabeça!
Capa preta, folhas brancas,
agora corre, vá só um pouco.
(respira. passado. respira)
Pai vês-me? 
Abraça-me vá, para as danças
salta-me para dentro
(sensação. impressão. sensação)
minha querida e amada filha escrita em páginas claras com resto de lápis. Tenho tanto na cabeça escondido atrás das esquinas aonde passei, um pedaço de árvore e sinto-lhe o toque no papel, o parque no papel, tudo no papel e tu danças e não vens sentir-me, tirar o espaço dos braços.
Meu pequeno amor já não suporto a noite, mas vou. Como te explicar ... lembras-te dos senhores tocando no parque aquela música que não entendias? lembras ... a vida é aquilo, não perceber o som, serão carros ou as páginas correndo rápidas?
Apontamentos sobre negro, o parque à noite aonde a vida se apressa em minutos antecipados por horas de néon e a simpatia varrida de todos os mapas da terra,
só escuro
luxo
só negrume
luxo
só escuro, luxo e negrume vertidos num outro que não eu agora de caderno preto na mão, tu correndo enquanto as páginas tão limpas voam,
dança amor, abraça-me, não dança, pronto faz tudo e nesse turbilhão de vida mistura o meu nada.

Chega o amor que temos, nem filhos, nem pais ou certezas escritas no papel dos registos. Chega o amor. Deitar no conforto, esquecer o luxo só por uma casa aonde o telefone diga: tanto tempo até o trabalho. 
Em síntese saber-me teu enquanto ruminamos um filme fraco que não interessa, nem saber as cambiantes do enredo e os participantes, transformar tudo uma cama de sons que protege a vida dos parques de entrar. Tu agarras-me e a vida toda lá fora, hoje só um filme distante e uma sensação de pertença impossível de explicar nos textos, porque os textos só falam das incertezas e o nós é definitivo quanto o tempo nos permite. 
Vejo que dormes, acalmas as sensações pelos sonhos. Que felicidade é esta? De onde nos vem tal caminho de dourado pisar?
É isto o eterno, se morrer o tempo quero que seja isto: ver-te dormir feliz na intimidade dos meus braços até os olhos se reabrirem e descobrirem de novo "é isto uma casa". 
Não precisamos de filhos, pais ou certezas escritas. Talvez nos baste unicamente um amor que desafie o real. 

Tudo que se faz é mal feito, vejam-se os círculos acabando e começando, sem fim ou princípio. Quando se faz termina-se.
Confesso, na verdade sou mau desde que nasci e todos os meus dias caberiam num caderno preto de folhas brancas aonde salta e dança a minha ânsia. Tédios semelhantes aos dias de nevoeiro aonde nada se vê, nada se entende, tudo nos foge aos olhos como se realmente a existência fosse uma invenção acadêmica. Dores profundas como o escuro do quarto na infância, esse breu tão palpável como uma lição verdadeira, as lições que os sentimentos dão, aonde nascem os medos que chamamos eternos porque nos enchem a vida toda.
Ah como eu criei filhos e fi-los crescer, mas eles revoltaram-se contra mim! Até a paixão, a minha filha dançante vejo hoje perder-se no lápis das páginas correndo.
Terei andando a vida toda procurando o último negro?
Confortei-me com maçãs caídas, arrancadas, roubadas e fiz bem, fiz bem como só quem faz um mal visível pode fazer, porque não existe isso a que chamam santos. As máximas passam de moda, o tempo é uma massa de modas e, bem nos fins repetidos, o tempo passa sempre nesta dança de sacrifício pagão.
Portanto o que é a culpa? Terá sido deixar os salões morrerem em mim? Fiz tudo isso por ti, porque não havia mais nada e agora sei que dizendo "mais e nada" invoco o tudo escondido entre a presença e a ausência. Presente nos meus braços, ausente nas minhas lágrimas e um rio de parques aonde existe ainda quem me suporte, porque há quem só viva de fantasmas e devemos dar graças aos imundos por tal nobre serviço.
Pudesse eu usar a tua cabeça degolada como meu lar e gritar sobre o teu cadáver tudo que camadas de vielas deixaram em mim: "Oh me amor eu nunca aprendi!".
Comentários
1 Comentários

1 comentários:

João Mateus disse...

Essa imagem fez-me lembrar um filme português...como desenhar um circulo perfeito....não sei se conheces...infelizmente não consigo encontrar há venda...um abraço!!