Há pouco a dizer sobre nós. Temos um anel no dedo, famílias iguais e uma conta conjunta. Partilhamos uma cama e temos encontros biológicos espaçados pelos picos de desejo e tédio. Somos casados e vivemos o infernal "eternamente felizes".
Encarnamos em nossa pele os desejos de gerações e povos, e, lá fora, um jardim lindo dá rosas formosas.
A nossa vida são rosas sem espinhos.
A nossa vida é umas palavras belas em dias especiais.
A nossa vida é o oco do sonho importado.
Que mundo é este?
Seis horas: despertador, sono, realidade.
Sete horas: o teu rosto, o jornal, os miúdos.
Nove horas (após a birra dos putos e o trânsito): trabalho para um tipo que não suporto.
Até às seis ocidentais: olhar para a cara do desprezível chefe.
Oito da noite (após os pedidos dos putos e mais carros em fila): jantar, a tua cara, as queixas das nossas mães.
Nove horas nocturnas: novela, putos na cama, livros da estante.
Dez horas de marasmo (ou mais tarde): cama onde te deitas após uns cremes que não conheço. Quando começaste a colocar creme?
Adormecemos certos de que amanhã será igual. Se tivermos um pico harmónico, temos um sexo habitual e rápido. Deixamos de ter paixão à muitos sóis atrás.
Um dia, a tua irmã, a mais nova, mostrou-se interessada nas minhas vontades viris. Disse-lhe que não e corri a ver-te. Acho que isto prova que te amo.
Não sei.
Gostava de amar, era tudo mais fácil!